quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Limiar da reatividade, a linha invisível

Quem faz treino de cães, e tenta resolver problemas de comportamento passa os dias a medir limiares de tolerância dos cães. A observar a linguagem corporal do cão, os sinais comunicacionais que nos dá e em que ponto mudam. Existe um limiar em todos os cães onde o comportamento calmo é substituído por um comportamento reativo, medroso, agressivo, excitado, etc.
Existem duas pessoas que colocaram muito bem em livro a importância destes pontos invisíveis, a Leslie Mcdevitt no livro "Control Unleashed" e a Grisha Stewart em "BAT - Behavior Ajustment Training", dois livros extraordinários.
A melhor forma de explicar este conceito ao qual chamam em inglês "threshold", é da Leslie McDevitt, ela escreveu: "Imagine que teve um dia mau hoje. Os seus filhos tiveram uma briga logo de manhã, que geriu de forma rápida e habilidosa. Perderam os trabalhos de casa, mas você encontrou-os. Perderam o autocarro, por isso você levou-os até à escola por um trânsito infernal, com um sorriso na cara. Chegou tarde ao trabalho. No caminho de volta para casa teve uma batida de chapa com chapa. Mesmo sabendo que o acidente não foi sua culpa, manteve-se simpática e cordial com o idiota que lhe bateu. Quando ia para explicar ao Sr. Policia o que tinha ocorrido, ele observa que tem o selo de inspeção um dia fora de prazo... E você grita com ele!!!! Acabou de passar o seu limiar da paciência."
Este texto parece-me bastante claro, isto é o que em treino de cães consideramos o limiar. Os cães, através da sua linguagem corporal dizem-nos qual é o seu grau de reatividade perante um determinado estimulo, aquilo que o dono ou treinador deve fazer é manter o cão a uma distância desse estímulo que lhe permita ficar abaixo do limiar, mesmo ali antes de atingir esse limiar. Não é fácil acertar no ponto certo, mas se passarmos o limiar podemos aumentar a distância e tentar de novo.
Esta é a coisa mais elementar no treino de mudança de comportamentos reativos. No outro dia uma dona mandou-me um email acerca de um cão que tem um problema de agressividade bastante grave, segundo aquilo que foi descrito pela dona, mas ainda assim, mesmo que a dona me diga que ele assim que vê outro cão fica imediatamente agressivo, existe uma distância, uma barreira, etc. onde ele se mantem suficientemente calmo para que possa aprender.
E esta é a questão importante acerca desta barreira invisível. Os cães não aprendem quando o seu nível de medo, agressividade, excitação, etc., ultrapassa esse limiar, o cão fica num estado emotivo que não lhe permite aprender novos comportamentos, não é possível ensinar ao cão como se deve comportar quando ele se encontra nesse estado. Por isso temos de palpar o sítio onde esse limiar se encontra e ficar mesmo abaixo dele, e isso permite-nos trabalhar comportamentos alternativos em presença do estímulo que produz o comportamento desadequado, quando o cão oferece o comportamento alternativo com facilidade no ponto onde escolhemos, muito provavelmente o limiar do cão aumentou, ou seja, reduzimos a distância para o estímulo. Assim já podemos aproximarmo-nos mais, mais, mais até termos um cão que consegue manter o comportamento adequado a qualquer distância do estímulo indesejado por ele.
Vivam os vossos cães!

domingo, 7 de outubro de 2012

Dia Mundial do Animal

Mais uma vez comemorou-se o Dia Mundial do Animal. Já é costume neste blogue fazer referência ao dia, nem sempre com palavras positivas, às vezes, muitas vezes a verdade tem de vir ao de cima. A questão é essa, existem coisas que não podem ser contornadas, que têm de ser abordadas.

Este dia, ou as coisas que aconteceram em torno dele tiveram um sabor agridoce. Foi bom e mau ao mesmo tempo. Este tem sido um ano de desânimo, de desilusão para mim, por isso os poucos posts, mas tem sido um ano de revolta e de indignação, coisa ao qual o dia 4 de Outubro não escapou.

Porque é que os promotores de uma Corrida de Touros marcam a dita para o dia em que se comemora os direitos dos animais, coisa à qual as touradas estão isentas porque se consideram uma exceção, por ser uma tradição nacional? Porque é que estas pessoas, que se movem para não permitir a aprovação de um novo estatuto do animal marcam uma Tourada para o único dia do ano que comemora o contrário daquilo que se passa no interior de uma praça? Isto é incrível, mais ainda por se tratar do canal público de televisão. Mas o canal, que passou essa afronta, momentos antes no programa "Linha da Frente" retratou os cães, nomeadamente a questão dos cães de raça potencialmente perigosa. Esse retrato foi também um hino à ignorância que existe em torno desta questão, por momentos pensei que seria um bom programa, por ter a participação do Dr. Ian Dunbar, mas foi uma participação desperdiçada, completamente obliterada no meio da ignorância que esteve presente pelo programa.

Antes do Decreto de Lei das raças potencialmente perigosas ter saído já existia um documento da Associação Europeia de Veterinários a aconselhar para a não criação de leis baseadas na raça do cão, porque a perigosidade do cão está associada à sua educação específica e não à raça a que pertence. Este documento data de 2000, estamos em 2012 e continuamos a ver e ouvir coisas perfeitamente idiotas. Sou enfermeiro e nos dois anos que trabalhei numa urgência, e mesmo agora num Centro de Saúde, nunca tive ferimentos de uma dentada de um cão de raça potencialmente perigosa, tratei dezenas de dentadas de cães, muitas delas os cães são da própria pessoa mordida, as situações são várias, mas as raças são as que são mais comuns na região, porque realmente a raça não é o que leva a estes acontecimentos.

Felizmente agora já li um artigo da Cláudia Estanislau e já estou muito mais calmo.

Localmente fui convidado para participar num evento comemorativo que juntou todos os intervenientes ligados à cinofilia, pela primeira vez todos participaram num único evento, uma proeza conseguida pelo Hospital Veterinário do Baixo Alentejo, pelo Dr. André Cláudio, que está de fato de parabéns pelo feito. Juntaram-se uma quantidade de pessoas amantes de cães muito superior a qualquer outra altura, falei com pessoas, pude trocar ideias, foi uma tarde muito bem passada, com muitos cães, muita alegria e muito entusiasmo, coisa rara na nossa pequena cidade.

Este dia trouxe-me de volta, acabou por ser impossível participar, por falta condições, mas ainda assim adorei. Quem é apaixonado como eu por cães sabe como é poder estar rodeado por eles durante horas... carregam-nos as pilhas.

FELIZ DIA MUNDIAL DO ANIMAL!!!